As livrarias independentes perderam lugar, primeiramente, para as grandes redes de livrarias de descontos, como a Barnes & Noble, e depois para os super eficientes varejistas on-line, como a Amazon.com.
Agora vemos surgir a era do livro eletrônico. Com este novo desafio, estas lojas logo terão como aliado o gigante da busca eletrônica: o Google.
No fim deste verão no hemisfério norte, o Google pretende lançar seu tão aguardado produto no segmento de publicação digital, o chamado Google Editions. Até o momento, a empresa revelou bem pouco sobre a empreitada, descrevendo a mesma como um esforço para vender livros digitais que poderão ser lidos através de um navegador de internet e acessível a partir de qualquer computador conectado à internet.
Um detalhe do Google Editions começa a ganhar atenção especial. A empresa está prestes a fechar um contrato com a American Booksellers Association, associação americana das livrarias independentes, para fazer do Google Editions a principal fonte dos chamados e-books – ou livros eletrônicos – nos sites de centenas de livrarias independentes de todo o país. Estas são informações do próprio Google e da associação.
Livrarias buscam agradar um público crescente de pessoas que preferem ler na tela a ler no papel
A parceria poderá beneficiar livrarias adoradas naquele país, como a Powell's Books in Portland, do estado de Oregon; a californiana Kepler's Books e a nova-iorquina St. Mark's Bookshop. Para agradar um público crescente de pessoas que preferem ler na tela a ler no papel, estas pequenas lojas até então eram obrigadas a competir de igual para igual com a Amazon, a Apple e a Sony.
O novo negócio do Google poderá oferecer um ponto de apoio a estas lojas neste crescente mercado, ajudando-as a evitar que sua clientela fiel migre para os concorrentes.
"O Google tem mostrado um interesse real em nosso mercado. Por diversas razões, esse é um acordo excelente ", disse Len Vlahos, presidente da associação que reúne mais de 1.400 livrarias associadas.
O Google provavelmente enfrentará uma batalha árdua para penetrar no já congestionado mercado de e-books. Alem de pouca experiência no varejo, o cadastro de clientes da empresa é bem menor que o da Amazon ou da Apple. Além disso, seu sistema de pagamentos on-line, o Google Checkout, ainda não teve ampla aceitação.
Entretanto, o Google está promovendo seu novo plano como uma alternativa mais "aberta" e completamente diferente das de seus concorrentes. Apesar de funcionar como uma loja de varejo, vendendo livros a partir do próprio site, o novo sistema também irá operar como atacadista, permitindo que livrarias independentes e outros parceiros vendam seus e-books a partir de seus próprios sites.
Segundo revelou a empresa, aqueles que comprarem e-books do Google não ficarão presos a algum formato ou dispositivo de leitura. O mesmo não ocorre com livros comprados na iBookstore da Apple, que só podem ser lidos em dispositivos da marca.
"Eu não acho que alguém que tenha comprado um dispositivo de leitura de livros nos últimos anos tenha a intenção de comprar seus livros eletrônicos do mesmo fornecedor para o resto da vida", disse Tom Turvey, diretor de parcerias estratégicas do Google, que encabeça o projeto Google Editions.
Turvey afirmou que os consumidores poderão ter acesso a seus livros, ou comprar novos, a partir de qualquer lugar do planeta, ao inserir seus dados no Google. O executivo também informou que o Google irá lançar o serviço com uma vasta seleção de centenas de milhares de livros - que vão desde ficções e não-ficções até títulos profissionais e acadêmicos, incluindo livros didáticos.
O Google já conta com dois milhões de livros disponibilizados por editoras afiliadas ao Partner Program, programa que permite que internautas acessem extensas amostras de livros a serem lançados - tanto nos sites Google quanto em outros sites. Um projeto anterior, que visava escanear milhões de livros raros ou esgotados, está atrelado a um processo judicial desde 2005.
Como atacadista, o Google irá operar como as distribuidoras de publicações offline, como a Ingram Book e a Baker & Taylor, que compram livros de editoras e os revendem às livrarias. Estas empresas geralmente ficam com uma porcentagem inferior a 10% das vendas, e Turvey disse que o Google irá operar nos mesmos moldes.
Livrarias independentes parecem acreditar que o Google está mais interessado em usá-las como ferramenta de trabalho do que operar diretamente no varejo. Na verdade, elas estão contando com isso.
A onda das publicações virtuais vem forçando tais livrarias a enfrentar um mercado complexo e em constante mutação. Em 1999, a Powell's in Portland, por exemplo, apostou em vender livros eletrônicos para a Rocket Book, pioneira no segmento de livros eletrônicos, e acabou tendo de enfrentar a falência da mesma. Outro caso mais recente foi o da Powell's que, com a ajuda da Ingram Digital, tentou vender e-books em seu site em diversos formatos, dentre eles Adobe, Microsoft e Palm.
Tais esforços tiveram pouco retorno, e dispositivos como o Kindle, da Amazon, o Nook, da Barnes & Noble e o iPad, da Apple, ganharam a atenção dos leitores.
"O Google vai nos permitir atuar totalmente fora do jogo centrado em dispositivos", disse Darin Sennett, diretor de desenvolvimentos da web da Powell"s.
Sennett admitiu que o Google também será um concorrente, pois venderá livros a partir do próprio site. Ele parecia acreditar, porém, que o Google irá favorecer seus parceiros menores.
"Eu não acredito que o Google tenha a intenção de minar as vendas ou vender mais que seus parceiros varejistas. Eu duvido que a empresa vai fazer recomendações de livros em termos editoriais ou ainda escolher o que as pessoas deveriam ler, que é algo que as livrarias fazem", disse o executivo.
Ele completou: "Fico imaginando que, a essa altura do campeonato, isso seria uma ingenuidade. Vamos ter de esperar para ver".
O projeto de vender livros digitais coincide com uma mudança mais ampla da empresa ao entrar no mercado de mídia digital. Desde sua criação que o Google ganha dinheiro quase que exclusivamente com textos publicitários colocados na lateral dos resultados da busca e em páginas da web.
Agora, concorrentes como a Amazon e a Apple estão tentando se estabelecer nas vidas e carteiras do consumidor - armazenando filmes, programas de TV, música e livros em seus servidores. As empresas esperam que o armazenamento de coleções de mídia do consumidor irão gerar ainda mais vendas digitais, ao mesmo tempo em que prendem o consumidor aos dispositivos que comercializam, como o Kindle e o iPad.
O Google tem uma vantagem nessas emergentes disputas de mídia. A empresa pode contar com um grande número de pessoas que usam seu motor de busca para fazem consultas sobre temas relacionados à mídia – como procurar o novo romance de John Irving, por exemplo – e clicam, instintivamente, na primeira opção de compra apresentada.
Em entrevista concedida na semana passada, Eric E. Schimidt, executivo-chefe do Google, afirmou: "O Google Editions foi uma conseqüência natural do fato de estarmos interessados em livros e em informação, e de trabalharmos com editoras". Quando perguntado sobre musica digital, ele disse que por muito tempo o Google evitou o mercado de música por não querer apoiar a pirataria.
Mais recentemente, porém, à medida que o Google vai oferecendo aos consumidores mais do que eles estão buscando, sem precisarem mesmo de clicar em algum lugar - o executivo-chefe disse que "faz sentido ter algum tipo de serviço ligado à música".
* Por Brad Stone