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Comércio eletrônico cria disputa por ICMS entre Estados

O comércio eletrônico gerou em 2009 faturamento estimado em R$ 10,5 bilhões, valor 28% maior, em termos nominais, que o do ano anterior. O desempenho não passa despercebido pelos Estados. O aumento crescente das vendas pela internet acirrou uma disputa entre os governos estaduais pela arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre o comércio eletrônico. Estados como Ceará, Pernambuco, Bahia, Rio Grande do Norte e Mato Grosso querem uma mudança nas normas em vigor. São Paulo é um dos Estados que defendem a atual tributação.

Atualmente o ICMS sobre as vendas eletrônicas fica integralmente com o Estado que sedia os centros de distribuição de mercadorias. Um consumidor de Recife que compra via internet uma geladeira de empresa "pontocom" que armazena seus produtos em São Paulo, por exemplo, tem sua aquisição considerada como venda direta ao consumidor. Nesse tipo de venda, o Estado paulista ficaria com todo o ICMS, que tem alíquota geral de 18%. Numa compra convencional, São Paulo ficaria com imposto de 7% calculado sobre a mercadoria e Pernambuco com o restante.

Além da substituição cada vez maior da compra em lojas físicas pela aquisição via internet, Estados que defendem a mudança de tributação indicam a participação crescente das regiões Nordeste e Centro-Oeste no comércio eletrônico do país, o que torna a perda de ICMS para eles maior ainda. Dados do e-bit, empresa especializada em estatísticas sobre comércio eletrônico, revelam que de 2001 para 2008 a região Nordeste aumentou de 7% para 11% a participação no comércio eletrônico. Já a região Centro-Oeste subiu de 5% para 7%, no mesmo período.

José da Cruz Lima Júnior, representante do Estado de Pernambuco na Comissão Técnica Permanente (Cotepe), órgão integrante do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), conta que o governo pernambuco deixa de arrecadar, com o modelo atual de tributação, o equivalente a 10% de sua atual arrecadação do segmento varejista. Mato Grosso do Sul diz que deixa de recolher R$ 350 milhões anualmente, o que seria um pouco mais da metade de sua arrecadação total no segmento varejista.

"Essa questão deve ser uma das grandes discussões da pauta do Confaz este ano", diz Carlos Martins Marques Santana, secretário de Fazenda da Bahia e coordenador do Confaz. Enquanto a solução consensual no conselho não vem, porém, alguns Estados tomam iniciativas próprias. "Os Estados têm tentado dificultar a entrada de caminhões com mercadorias vendidas por meio eletrônico como forma de proteger sua arrecadação", diz Santana.

Mato Grosso, por exemplo, determinou que os fornecedores cadastrem eletronicamente as operações de remessa de mercadorias ao Estado ou emitam a nota fiscal eletrônica. A regra vale para venda de produtos acima de R$ 900. Quem não se cadastra fica sujeito à fiscalização física das mercadorias na entrada do Estado. Os caminhões podem ficar parados para verificação por até 72 horas e estão sujeitos ao pagamento de 9% de ICMS até que a regularidade dos produtos transportados seja averiguada.

O secretário-adjunto da Receita Pública de Mato Grosso, Marcel Souza de Cursi, diz que o cadastramento é um processo simples. Mesmo assim, a exigência gerou questionamento judicial e uma grande empresa de vendas pela internet conseguiu liminar contra a medida.

O Ceará também faz fiscalização de caminhões semelhante ao do Mato Grosso e exige pagamento de ICMS na entrada de mercadorias no Estado. A Fazenda cearense recolhe o imposto nos casos em que a venda à pessoa física no Ceará ultrapassa R$ 1.212,35. O ICMS, exigido do fornecedor ou do transportador, é de 10%, para o caso das mercadorias tributadas a 25% do imposto, ou de 7,5% nos demais casos. Entre as mercadorias sujeitas a esse pagamento estão equipamentos e materiais elétricos, eletroeletrônicos, eletrodomésticos, móveis e produtos de informática.

O exemplo dos dois Estados deve ser seguido pela Bahia. "Já separei um grupo de trabalho para analisar medidas de proteção à arrecadação, que podem ser tomadas incorporando as experiências de Mato Grosso e Ceará", conta Santana.

Pernambuco ainda não tomou nenhuma medida prática para garantir a arrecadação do comércio eletrônico, mas defende a mudança do atual modelo de tributação no Confaz, além de acompanhar a proposição de duas emendas constitucionais que estabelecem para o comércio eletrônico o mesmo tratamento dado às vendas convencionais de mercadorias.

Em nota, a Secretaria da Fazenda de São Paulo diz que a Constituição Federal garante ao Estado de origem a arrecadação de ICMS sobre as vendas diretas ao consumidor, como é o caso do comércio via internet. A Fazenda diz ainda que a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional entende da mesma forma.

Lima Júnior, que representa Pernambuco no Confaz, explica que essa é realmente a previsão constitucional, mas o Confaz pode estabelecer exceções. O grande exemplo fica por conta da venda eletrônica de automóveis pelas montadoras. Um convênio do Confaz estabelece nesse caso uma divisão de arrecadação de ICMS entre o Estado de origem e o de destino. "A proposta é criar para todo comércio eletrônico um convênio semelhante ao assinado para as vendas de automóveis pela internet", explica Martins.

Lima Júnior diz que não há muitos argumentos jurídicos para os Estados de destino cobrarem o ICMS nas operações eletrônicas. A exceção fica por conta de operações que, numa zona cinzenta, talvez possam ser questionadas. Uma delas é o que ele chama de venda pela internet por meio de lojas "show room".

Essas lojas, explica, possuem estabelecimentos de venda no Estado de destino, apenas com produtos de mostruário para clientes que escolhem o produto na loja. A encomenda, porém, é efetuada por meio eletrônico no próprio estabelecimento, dando origem a uma venda direta ao consumidor.

"O ideal é que haja um novo mecanismo constitucional para a nova realidade virtual", diz Waine Domingos Perón, do escritório Braga & Marafon. Ele lembra que as medidas dos Estados para defender a arrecadação de ICMS tendem a prejudicar fornecedores e transportadores de mercadorias. "Em alguns casos, a empresa paga todo o imposto na origem e recolhe novamente no destino. Esse tipo de medida tende a ser questionado."

Fonte: Valor Econômico



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Roberto Oliveira

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