É inegável que a informática está presente em tudo que fazemos, seja no armazenamento de números de telefone em uma agenda eletrônica, seja na imediata emissão de um boleto para recolhimento de custas judiciais de um processo.
Com o surgimento do ciberespaço, conveniente combinação da tecnologia dos computadores com a telecomunicação, foi traçado um novo desafio para o Direito: a necessidade de reger as relações ocorridas em um novo espaço, sem limites geográficos, destituído de elementos orgânicos, distinto dos limites físicos conhecidos.
É possível dizer, através de analogia, que os conflitos gerados no espaço virtual se assemelham àqueles existentes no direito comum, como embates acerca de proteção da privacidade, da propriedade e do consumidor. Para que o mundo digital possa ser compreendido e incorporado com mais suavidade à ciência do direito, faz-se necessária a equiparação com os atos e conseqüências jurídicos já estabelecidos antes do surgimento do espaço virtual. Ao contrário do que propõe algumas correntes, o mundo virtual não é capaz de se auto-regular, sendo o Direito ramo da ciência necessário para tal organização.
E-commerce e os contratos eletrônicos
Primeiramente, destaca-se que, antes de ser classificado como comércio do tipo eletrônico, os contratos celebrados via Internet não devem ser desvinculados da teoria geral dos contratos, apresentando apenas algumas variações no que tange às suas peculiaridades. Os contratos celebrados através da rede têm que respeitar as normas contratuais gerais (tais como capacidade das partes, objeto lícito e manifestação de vontade), sob pena de ineficácia do negócio jurídico celebrado.
Diante destas considerações, conclui-se que os contratos realizados no comércio eletrônico têm a mesma validade dos contratos comerciais. O fato de serem celebrados no espaço virtual não mingua seus efeitos jurídicos. As transações comerciais feitas no ciberespaço são classificadas em três grupos: transações entre empresas, transações entre financeiras e de valores imobiliários e transações entre empresas e consumidores finais. As relações entre as empresas e consumidores finais, também chamadas business to consumer, subdivide-se em três outros grupos, conforme o objeto do contrato: sobre prestação de serviços online, venda de bens tangíveis que são comercializados através da rede e entregues fora do espaço cibernético e a venda de bens intangíveis, que são entregues ao consumidor diretamente pela rede.
Os contratos virtuais e a proteção do consumidor
Constatada a existência de desigualdades entre fornecedores e consumidores no comércio pátrio, o CDC estabelece em seu artigo 49, a possibilidade do consumidor desistir do contrato, no prazo de sete dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produto e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio.
A proteção estabelecida no artigo 49 do CDC teve como principais fundamentos a omissão de informações acerca do produto, a falta de tempo para reflexão sobre o custo-benefício oferecido, impossibilidade de comparação com produtos similares e a compra e venda por impulso, realizada através de técnicas agressivas de marketing. A princípio, discute-se se o espaço virtual é ou não considerado estabelecimento comercial, para fins de aplicação do artigo 49 do CDC. Ainda que de forma bem distinta do estabelecimento comercial clássico, nos chamados sites, os produtos e serviços à venda também estão expostos para o consumidor. Ocorre que no estabelecimento virtual não há contato físico do consumidor com as mercadorias e sua manifestação de vontade no sentido de aceitar a contratação é feita através da transmissão eletrônica de dados.
A doutrina majoritária é favorável à aplicação do direito de arrependimento nos negócios jurídicos realizados pela internet, não se podendo deixar de mencionar o entendimento diverso de alguns autores que defendem que o interesse inicial é do consumidor, tendo em vista que é o próprio consumidor quem vai à procura do fornecimento de bens ou serviços.
Retornando ao posicionamento majoritário, a argumentação é de que cabe o direito de arrependimento nos contratos telemáticos não em virtude das técnicas agressivas de vendas utilizadas, mas sim pela ausência de contato real do consumidor com o bem adquirido. Vale lembrar que, optando o consumidor por exercer seu direito de devolução dentro do prazo de reflexão, deve este cuidar para que o produto não estrague ou desvalorize, uma vez que o bem deve ser restituído ao fornecedor nas mesmas condições em que foi vendido.
Ressalta-se a existência de controvérsia acerca da aplicação ou não do artigo 49 em relação à venda de bens intangíveis (produtos ou serviços incorpóreos). A principal questão levantada é como saber se o consumidor, após exercer seu direito de arrependimento, não conservou uma cópia do produto. Frente à inversão do ônus da prova estabelecida no inciso VIII do artigo 6º do CDC, de fato, com a tecnologia atual, seria extremamente difícil para o fornecedor produzir provas de que o produto vendido foi copiado antes da devolução.
Em se tratando da peculiar venda de bens imateriais através da rede, levando-se em consideração a imprescindibilidade da boa-fé, tanto do fornecedor quanto do consumidor, quando da realização e execução do negócio jurídico contratado virtualmente, corrobora-se com a doutrina majoritária de que a aplicação do direito de arrependimento seria anti-funcional e até mesmo excessiva para seus propósitos.
*Patrícia Rosendo de Lima Costa é advogada, sócia do escritório Homero Costa Advogados, bacharel em Direito pela Faculdade de Direito Milton Campos em 2006, experiência nas áreas consultiva e contenciosa cível e empresarial, inclusive consumerista.
Com o surgimento do ciberespaço, conveniente combinação da tecnologia dos computadores com a telecomunicação, foi traçado um novo desafio para o Direito: a necessidade de reger as relações ocorridas em um novo espaço, sem limites geográficos, destituído de elementos orgânicos, distinto dos limites físicos conhecidos.
É possível dizer, através de analogia, que os conflitos gerados no espaço virtual se assemelham àqueles existentes no direito comum, como embates acerca de proteção da privacidade, da propriedade e do consumidor. Para que o mundo digital possa ser compreendido e incorporado com mais suavidade à ciência do direito, faz-se necessária a equiparação com os atos e conseqüências jurídicos já estabelecidos antes do surgimento do espaço virtual. Ao contrário do que propõe algumas correntes, o mundo virtual não é capaz de se auto-regular, sendo o Direito ramo da ciência necessário para tal organização.
E-commerce e os contratos eletrônicos
Primeiramente, destaca-se que, antes de ser classificado como comércio do tipo eletrônico, os contratos celebrados via Internet não devem ser desvinculados da teoria geral dos contratos, apresentando apenas algumas variações no que tange às suas peculiaridades. Os contratos celebrados através da rede têm que respeitar as normas contratuais gerais (tais como capacidade das partes, objeto lícito e manifestação de vontade), sob pena de ineficácia do negócio jurídico celebrado.
Diante destas considerações, conclui-se que os contratos realizados no comércio eletrônico têm a mesma validade dos contratos comerciais. O fato de serem celebrados no espaço virtual não mingua seus efeitos jurídicos. As transações comerciais feitas no ciberespaço são classificadas em três grupos: transações entre empresas, transações entre financeiras e de valores imobiliários e transações entre empresas e consumidores finais. As relações entre as empresas e consumidores finais, também chamadas business to consumer, subdivide-se em três outros grupos, conforme o objeto do contrato: sobre prestação de serviços online, venda de bens tangíveis que são comercializados através da rede e entregues fora do espaço cibernético e a venda de bens intangíveis, que são entregues ao consumidor diretamente pela rede.
Os contratos virtuais e a proteção do consumidor
Constatada a existência de desigualdades entre fornecedores e consumidores no comércio pátrio, o CDC estabelece em seu artigo 49, a possibilidade do consumidor desistir do contrato, no prazo de sete dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produto e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio.
A proteção estabelecida no artigo 49 do CDC teve como principais fundamentos a omissão de informações acerca do produto, a falta de tempo para reflexão sobre o custo-benefício oferecido, impossibilidade de comparação com produtos similares e a compra e venda por impulso, realizada através de técnicas agressivas de marketing. A princípio, discute-se se o espaço virtual é ou não considerado estabelecimento comercial, para fins de aplicação do artigo 49 do CDC. Ainda que de forma bem distinta do estabelecimento comercial clássico, nos chamados sites, os produtos e serviços à venda também estão expostos para o consumidor. Ocorre que no estabelecimento virtual não há contato físico do consumidor com as mercadorias e sua manifestação de vontade no sentido de aceitar a contratação é feita através da transmissão eletrônica de dados.
A doutrina majoritária é favorável à aplicação do direito de arrependimento nos negócios jurídicos realizados pela internet, não se podendo deixar de mencionar o entendimento diverso de alguns autores que defendem que o interesse inicial é do consumidor, tendo em vista que é o próprio consumidor quem vai à procura do fornecimento de bens ou serviços.
Retornando ao posicionamento majoritário, a argumentação é de que cabe o direito de arrependimento nos contratos telemáticos não em virtude das técnicas agressivas de vendas utilizadas, mas sim pela ausência de contato real do consumidor com o bem adquirido. Vale lembrar que, optando o consumidor por exercer seu direito de devolução dentro do prazo de reflexão, deve este cuidar para que o produto não estrague ou desvalorize, uma vez que o bem deve ser restituído ao fornecedor nas mesmas condições em que foi vendido.
Ressalta-se a existência de controvérsia acerca da aplicação ou não do artigo 49 em relação à venda de bens intangíveis (produtos ou serviços incorpóreos). A principal questão levantada é como saber se o consumidor, após exercer seu direito de arrependimento, não conservou uma cópia do produto. Frente à inversão do ônus da prova estabelecida no inciso VIII do artigo 6º do CDC, de fato, com a tecnologia atual, seria extremamente difícil para o fornecedor produzir provas de que o produto vendido foi copiado antes da devolução.
Em se tratando da peculiar venda de bens imateriais através da rede, levando-se em consideração a imprescindibilidade da boa-fé, tanto do fornecedor quanto do consumidor, quando da realização e execução do negócio jurídico contratado virtualmente, corrobora-se com a doutrina majoritária de que a aplicação do direito de arrependimento seria anti-funcional e até mesmo excessiva para seus propósitos.
*Patrícia Rosendo de Lima Costa é advogada, sócia do escritório Homero Costa Advogados, bacharel em Direito pela Faculdade de Direito Milton Campos em 2006, experiência nas áreas consultiva e contenciosa cível e empresarial, inclusive consumerista.